terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Continuação da Discussão

O padrão de consumo segundo o sexo vem sendo objeto de discussão pela epidemiologia do alcoolismo. Tem-se descrito aumento na proporção de mulheres que consomem bebidas alcoólicas no período pós-guerra. Além disso, prevalências mais elevadas no sexo feminino de uso diário de álcool, de embriaguez semanal, de "bebedores leves" vêm sendo observadas com alguma consistência. Entretanto, esse aspecto não foi explorado na presente investigação.
Se os resultados observados quanto às variáveis sexo e grupo etário foram coerentes com os dados da literatura, o mesmo não pode ser dito com relação às chamadas variáveis socioeconômicas e culturais. No Brasil, prevalências mais elevadas de alcoolismo foram descritas para as menores faixas de renda per capita e de escolaridade. Entretanto, o presente inquérito mostrou associação entre o uso de álcool e os níveis de renda e escolaridade mais elevados.
Polich e Kaebler ao sumarizarem os resultados de inquéritos realizados nos EUA, entre 1964 e 1979, assinalam que as variáveis socioeconômicas se associam com o uso de álcool e com os problemas a ele relacionados. Segundo esses resultados, a abstinência é mais freqüente em indivíduos de padrão social e econômico mais baixos. Entretanto, entre aqueles que consomem bebidas alcoólicas, os problemas relacionados com o álcool são mais freqüentes nos níveis socioeconômicos inferiores.
Os presentes resultados estão, em parte, de acordo com aqueles sumarizados por Polich e Kaebler pois houve associação entre a abstinência e os níveis de renda inferiores. Entretanto, não é possível afirmar o mesmo quanto ao alcoolismo. Apesar das RPC ajustadas sempre apontarem para uma relação entre alcoolismo e níveis de renda e de escolaridade mais baixos, não foi possível rejeitar a hipótese nula de ausência de associação. Apenas a variável renda mostrou uma significância estatística entre 0,05 e 0,08 referente a RPC não ajustada, isto é, não controlada para variáveis potencialmente "confounding".
Para melhor responder à pergunta sobre associação entre nível socioeconômico e alcoolismo no Brasil são necessários estudos especialmente planejados e desenhados para este objetivo, e não a utilização de dados aproveitados de inquéritos, como tem sido feito até então. Dados assim gerados ressentem-se, entre outras coisas, de um número suficiente de alcoolistas para constituir grupos adequados de comparação. Com isso, análises que utilizam estratificação e modelos multivariados para o controle de variáveis "confounding" ficam prejudicadas e os testes estatísticos perdem poder, isto é, rejeitam mais facilmente hipóteses verdadeiras.
Por outro lado, resultados de investigações conduzidas em outros países devem ser consideradas com cautela. As peculiaridades da estratificação social e econômica no Brasil não devem ser menosprezadas, e variáveis como escolaridade, renda, índices de posse de bens materiais nem sempre guardam relações homogêneas como as observadas em outras populações, sobretudo do primeiro mundo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário